O monumento ao jesuíta António Vieira, em Lisboa, e o debate sobre a “conquista” e a colonização portuguesas das terras americanas

Autores

  • Pedro Cardim

DOI:

https://doi.org/10.34913/journals/lingualugar.2021.e524

Palavras-chave:

Ameríndios, Colonização, Jesuítas, Brasil, Portugal

Resumo

Neste ensaio é apresentada uma reflexão crítica sobre um monumento recentemente erigido em Lisboa dedicado ao jesuíta António Vieira. Na sua primeira parte argumenta-se que tal escultura pouco diz sobre a “conquista” portuguesa das terras dos povos ameríndios e a imposição de uma forma de dominação que assentou na menorização, política e jurídica, dos indígenas. Na segunda parte do artigo argumenta-se que António Vieira se identificava com esse sistema de dominação e que pouco fez para o modificar de uma forma substantiva. Tal constatação serve, acima de tudo, para situar o jesuíta nos quadros culturais e políticos do seu tempo, e não para o julgar. Na terceira parte estabelece-se uma relação entre este monumento dedicado a Vieira e a persistente visão benigna da colonização portuguesa de terras americanas, asiáticas e africanas. No final, defende-se que, na atual sociedade portuguesa, há um crescente interesse por uma compreensão mais crítica, plural e justa do passado colonial.

Biografia Autor

Pedro Cardim

Pedro Cardim (Lisboa, 1967) é professor associado do Departamento de História da Universidade Nova de Lisboa e investigador do CHAM - Centro de Humanidades da mesma universidade. Dedica a sua investigação à história ibérica dos séculos XVI a XVIII, bem como à colonização da América pelos portugueses e espanhóis.

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O monumento ao Jesuíta António Vieira — Pedro Cardim

Publicado

2021-08-12

Como Citar

Cardim, P. . (2021). O monumento ao jesuíta António Vieira, em Lisboa, e o debate sobre a “conquista” e a colonização portuguesas das terras americanas. Língua-Lugar : Literatura, História, Estudos Culturais, 2(3), 66–82. https://doi.org/10.34913/journals/lingualugar.2021.e524